quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Uma tragédia anunciada

Quando Einstein usou a frase “Deus não joga dados com o universo”, estava dizendo que os desígnios divinos (expressão usada pelo filósofo contemporâneo Mário Figueiredo) não são aleatórios e que em todo acontecimento da natureza existe a lógica que o antecedeu.

Aliás, no caso da tragédia da região serrana do Rio de Janeiro, que já conta com 622 mortos e, certamente, quando começar o noticiário da meia noite, já serão 700 ou mais mortos, o acontecimento era mais que anunciado. Todo ano, em janeiro, a Cidade Maravilhosa é vítima de alagamentos sem precedentes e de tragédias menores. Se é que podemos falar que uma tragédia pode ser menor.

No ano passado, por exemplo, no mesmo janeiro, as chuvas, além dos alagamentos na capital, fizeram dezenas de vítimas em Angra dos Reis, em decorrência de deslizamentos de terras ocasionados pela mesma combinação do ocorrido na região serrana: montanhas de pedras maciças, fina camada de terra, retirada de árvores, que tornam o solo poroso e sem fixação, e construções irregulares em locais instáveis.

Como se vê, voltando à citação einsteniana, a tragédia foi mais que anunciada. Tanto foi anunciada que o sistema meteorológico brasileiro avisou às Prefeituras da Região que ocorreriam chuvas fortes no período, aviso este que foi totalmente ignorado pelos municípios.

Quase todos. Justiça seja feita, houve um Município, se minha memória não me trai o de Areal, que, avisado pela meteorologia, o Prefeito colocou um simples carro de som nas ruas pedindo para a população que estava em áreas de risco abandonasse as suas casas. No Município não houve vítimas.

Aliás, no quesito de tragédias anunciadas, apareceu no noticiário de domingo passado as enchentes no Japão e na Austrália em decorrência das mesmas chuvas que assolam o Rio. Na Austrália, um brasileiro falava ao telefone com o repórter dizendo que recebeu uma carta do sistema de meteorologia solicitando que abandonasse a sua casa, pois estava próxima ao rio e que provavelmente a moradia seria alvo da enchente. Dois dias depois a casa havia sido levada pela força das águas e o brasileiro imigrante estava são e salvo graças à cartinha. No Japão então, o que falar? Na década de 50, o País foi atingido por um tufão que matou 3000 pessoas. Após isso, um tufão dessa magnitude não apareceu mais. Mas se aparecer, o País conta com grandes comportas para conter as águas dos rios e do oceano, gigantescas piscinas subterrâneas para armazenar as águas das chuvas e/ou dos transbordamentos dos recursos hídricos, planos de evacuação pregados nos postes e, uma vez por ano, é feito um treinamento de evacuação para a população, além de um sistema de monitoramento de catástrofes que mais parece a sala de comando da nave espacial do Capitão Kirk. Saldo de mortos: Na Austrália, 22, no Japão, não sei, mas não lembro de ter ouvido falar de algum...

Quando será que aprenderemos? Quantas tragédias anunciadas mais ocorrerão? Quanto mais será necessário dizer que a natureza se vinga pelo desmatamento, pela retirada de árvores, e pela construção em locais irregulares? Quanto mais será preciso avisar que em janeiro chove no Rio de mesmo mês e que deverá sempre se ter precaução com essas chuvas e estar preparado para elas?

Doutor Figueiredo, sei que saiste de Petrópolis dia 09, um fim de semana antes desta tragédia ocorrer. Peço: não apareça mais por lá em janeiro. Pelo menos até nós entendermos que o ocorreu não se deve aos desígnios divinos,  mas sim à imprevidência e teimosia dos homens.

3 comentários:

Camila Cavalcanti disse...

Poucas coisas nos deixam tão tristes quanto essas catástrofes. Você tem toda razão, o nosso Governo está engatinhando e não se prepara para o que realmente importa para a população. A população, por sua vez, mesmo quando tem o mínimo conhecimento do perigo, decide que ali é o local certo para construir e permanecer. É um conjunto de erros e desencontros. A natureza SEMPRE se vinga. Esse é o meu maior medo. Temos que respeitá-la. Belém já está indo para o fundo com as chuvas. Rezemos para que nenhuma catástrofe igual chegue por aqui.

Mário Figueiredo disse...

Prezado Dr. Ary,
Eu não conhecia essa sua faceta de cronista, o que muito me alegra ! A descrição dos fatos que antecederam os acontecimentos tristes na Regição Serrana, estão em perfeita sintionia com o descaso das autoridades. Nunca " sabem de nada " ! Quando as catástrofes acontecem, todos chegam para faturar prestígio que, lamentavelmente, direcionam suas vidas. O povo que se dane !
Consta aqui no Rio que, além das chuvas e da tromba d'água, houve, tembém, um abalo císmico (terremoto), pois todas as pessoas entrevistadas em Nova Friburgo dizem que um 'estrondo forte" antecedeu a tragédia. Estão apurando.
Veja, no fim de semana passado -7,8 e 9-(sexta, sábado e domingo) estivemos em Areal, confraternizando com amigos de lá e outros de Campinas, que têm casa por lá. No dia 12, quarta, fomos almoçar em Petrópolis, na casa de uma tia da Ana. A mansão fica no bairro Rocia, perto de Araras, dentro do mato, cercado de mata virgem. Uma beleza de clima e vista. Voltamos às sete da noite. Quando chegamos no Rio, pela TV, tomamos conhecimento da tragédia. Tivemos muita sorte.

Parabéns pelo blog (não sei nem o que é isso, nem como se faz ! ), especialmente pela citação filosófica a mim atribuída. Só faço repetí-la.Não sou seu criador.
Manda dizer como é que eu leio as futuras edições do blog.
Um forte abraço em todos os amigos daí.

Anônimo disse...

Aproveito o espaço do blog do Ary, do qual sou a leitora mais fiel depois da Camila, é claro, para manifestar minha alegria pela sorte dos queridos amigos Dr. Mário e Ana, que Deus continue lhes abençoando e direcionando sempre. Abs. Carla