quarta-feira, 20 de novembro de 2013

A Imperfeição

Ouso dizer, afirmo e confirmo, que a beleza está na imperfeição. Nada é mais belo que algo imperfeito, ainda mais nestes tempos em que a busca espartaniana do perfeito está cada vez mais latente. 


Explico: Cada dia que passa as pessoas se exigem mais. Tenho que ter o corpo bonito, mais malhado, tenho que ser o melhor profissional, tenho que ser um bom pai, uma boa mãe, o melhor esportista, o primeiro da turma, da universidade, o melhor profissional, o mais bem sucedido, o esteticamente correto, o politicamente certo. O certo, nunca admitindo a pequena falha, por menor que seja.

Já escrevi algumas linhas tempos atrás por aqui acerca do politicamente correto e que, na maioria das vezes não é real e, quando é, torna as pessoas chatas, o que é imperdoável. Portanto, não vou chover no molhado.

Voltando ao tema, o amor ao imperfeito tem como constatação empírica dois exemplos, minhas paixões - no que pese existirem muitos outros e possivelmente gerarem um livro se decidir enumerá-los -: os vinhos e as mulheres.

Sou apenas um enófilo, mas nada mais enfadonho que um vinho estruturalmente perfeito e equilibrado. Para que serve um bom vinho, geralmente caro, se se sabe o que vai se esperar dele. O olor, a cor, a persistência e todas as demais características corretas e sem defeitos que o faz excelente, mas que, ao final, sabe-se excelente, porém, sem nenhuma surpresa.

Da mesma forma as mulheres. Vejo mulheres hoje usando de todos os artifícios para ficar mais bonitas. Uma busca incessante pela beleza que passa, invariavelmente, pela academia e pela anorexia. E, o que é pior, muitas vezes não é a sociedade, mas a própria mentalidade da era atual que diz que somente sendo magra e malhada é que a mulher vai ser bonita. Criamos um exército de mulheres padrões, iguais, com corpos espetacularmente certos que, se não se deve à malhação, se deve ao bisturi.

Não estou fazendo qualquer ode ao "embagulhamento" feminino, muito menos tirando o pão dos cirurgiões plásticos. Por favor, não interpretem mal. Durante esses alguns anos de blog, todos já devem saber que, se for para ficar feliz, sou o maior incentivador, desde pular de pára-quedas até fazer tatuagem na polinésia com dente de tubarão.

O que condeno é a imposição da sociedade da beleza padrão, perfeita e a qualquer custo.

Lembro de um artigo que li, há muitos anos atrás, em um jornal diário, do Paulo Cal, que era amigo de infância do meu pai, que o tema central era as celulites. Dizia ele, se a minha memória não falha virtude do tempo, que as mulheres sem celulites não possuem estórias para contar, pois passam os seus dias em academias  e se privam de diversos prazeres da vida em busca do corpo perfeito. As mulheres com celulites sim, te acompanham e pedem a sua caipirosca e vivem a vida, se bem entendi do artigo.

Não quero ser tão radical e também infirmar o artigo, pois se, quem quer que seja, curtir academia ou a perfeição, deve os seus objetivos perseguir, como um hedonismo saudável.

Mas, certamente, o perfeito não é o belo. O belo tem que ter algo de errado, de diferente, de surpresa. De surpreendente.

Como exemplo, conta a lenda que Diego Rivera, o marido promíscuo de Frida Kahlo, se apaixonou pelas marcas de acidente que ela possuía. Logo ele que era um pintor e que se exigia o perfeccionismo. Quem sou para discutir? Melhor, não discuto por convicção, pois por convicção o belo não estão no perfeito, mas na diferença e, principalmente, na alegria modesta da pessoa de se achar bela.

O vinho, como a mulher, tem que ter um quê de imperfeição, que os diferencia e que os fazem ímpar. Que nos surpreende e que nos faz amá-los. Amá-los não cegamente, muito menos por serem perfeitos, ao contrário, mas pelo fato de serem imperfeitos, como a condição humana.

E aí está a beleza da imperfeição, a surpresa e o fato de não ser comum, que torna as pessoas mais humanas e mais reais.

Da base.

Pedro de Nóvoa Cavalcanti ou, o nascimento de um Bebê

Achei perdida esta crônica de mais de dois anos atrás que, agora relato como escrevi na época, com algumas correções necessárias:


Este blog não foi feito para registrar acontecimentos da minha vida, mas para passar experiências aos que estiverem na mesma situação possam usá-las e tirar as suas próprias conclusões. Por este motivo, pretendo descrever o nascimento do meu filho, Pedro de Nóvoa Cavalcanti, apenas como uma experiência a orientar um pai como eu, de primeira viagem, sem qualquer referência subjetiva e ilações de cunho pessoal.

A criança mais linda deste mundo, a mais amada e esperada, nasceu às 7:12h, com 3,2kg e 56cm de altura. Melhor, de comprimento. Os preparativos para a sua chegada começaram três dias antes, da forma mais consistente. Digo isto porque, como todos sabem, na hora que o "casal" sabe que "está grávido", os preparativos se iniciam, mas, o que conta mesmo são os três últimos dias ou a partir da última consulta neonatal, quando se marca a data do parto, se for cesariano.

Eu sabia tudo de gravidez e parto. Me inscrevi em três sites de bebês e recebia emails diários, um deles bastente extenso, que me deixava informado de tudo sobre a gravidez. Meu primeiro conselho: não saiba tudo de gravidez e parto, pois a pessoa fica paranóica, pensando nas doenças que a criança pode ter, o que pode acontecer com a mãe, etc. Tente fazer uma leitura superficial da gravidez, aprendendo somente o necessário e, principalmente, segundo conselho, quando qualquer pessoa vier falar sobre alguma desgraça relacionado à criança ou à gravidez, diga que você não quer saber ou, simplesmente, não a escute, pois você vai certamente relacionar o comentário à sua criança ou à sua companheira. E você vai ver que a quantidade destas pessoas é muito maior do que você imagina. Se possível, exclua a amarga do seu convívio, até nascer o rebento, ou para sempre, se possível.

Voltando ao assunto, mesmo que as malinhas da mãe e do bebê estivessem prontas há quinze dias, você somente começa a pensar no parto com a data marcada. No meu caso foi segunda-feira, que por um motivo irrisório, a Preta brigou com ela mesma. Digo isso porque não se pode retrucar em nenhum momento, pois, mesmo que se esboce uma reação, o primeiro pensamento que vem é a antecipação do parto e a preocupação que eventual clima pesado pode trazer ao nascimento da criança. Então fique calado, deixando a outra falar e, mesmo calado, não espere que a briga vá ser menor do que outras que você teve. Certamente vai ser pior e, pior ainda, sem você ter qualquer direito de ficar chateado, pois a prioridade sempre é o filho e, mais, nunca vi uma grávida perder a razão, mesmo que você esteja calado. Usando o dito popular, nestes casos, calado já está errado.

Três dias trabalhando e três longas noites sem dormir depois, chego, estraçalhado e nervoso, às vésperas do nascimento do bebê. Precisava dormir bem, afinal, o dia seguinte era o grande dia. Jantamos cedo, pois a médica havia marcado o parto para as seis horas da madrugada, horário esse que somente conhecia quando amanhecia nos bares em outras épocas. Não se pode comer muito, pois a Preta ia passar por uma cirurgia e eu ia, e fui, assistir o parto e tinha que me precaver contra os efeitos do excesso de comida.

Aliás, a decisão de assistir o parto é muito complexa e, como se verá abaixo, tem que ser muito bem pensada para pais, como eu, que são de primeira viagem, pois as cenas são fortes e requerem um organismo muito bem equilibrado. No meu caso, a decisão foi simples e rápida: a Preta decidiu! Na primeira consulta do prénatal, a médica me perguntou: Tu vais ver o parto? A Preta, imediatamente e com a singelesa das decisões ditatoriais, respondeu: Vai. 

Pronto, estava decidido. E não podia falar nada, pois, se "estávamos grávidos" e ela iria passar por uma cirurgia, porque eu não poderia simplesmente assistir o parto? A lógica é irrefutável, e a decisão foi menos dolorida quando a Preta bateu o martelo por mim. 

No que pese a minha atitude tragicômica, não me arrependi em nenhum momento em ter assistido e, conta a minha moral imaginária e ilusória, fui essencial no parto do Pedro!

Depois de chegarmos por volta das 6h da manhã na Maternidade Saúde da Criança, com horário militar ou de insones, como estávamos, fomos para o quarto e logo chegaram a minha mãe e os pais da Preta. Todos nervosos e apreensivos. Recebemos a visita pouco depois das médicas do parto, Dras. Janete e Lia, uma prima e outra ginecologista que cuidou da Preta durante toda a sua vida e deixou de se aposentar dos partos somente para ter no nosso rebento na mão. Benza Deus, em uma linguagem popular.

Levaram a Preta de maca, com uma feição de pânico e pedindo que eu a acompanhasse. O Dr. Altino foi atrás e eu correndo sem saber o que fazer.

Entramos, eu e o meu sogro, em um closet - sei lá como era o nome do local e também não vou me preocupar em relatar agora, pois estou escrevendo sentindo a aflição da época -, que estavam as roupas verdes para entrar na sala de cirurgia. O meu sogro, médico pediatra, logo se vestiu, sem se preocupar com nada, tirando a sua roupa e colocando aqueles macacões, toucas e umas pantufas rudimentares parecidas com as toucas próprias para os pés. Enfim, equipado com toda a indumentária verde com cara de seriado americano ao estilo de Plantão Médico.

Olhou para mim e disse: - cuidado que existe muito furto aqui. Ele levam tudo que tu deixas.

Quando baixei para olhar alguma coisa ou esconder algum pertence, o velho Altino desapareceu! Não sabia sequer por onde tinha saído! Pelo pouco de lucidez que me restava saí, resoluto, com minha armadura de lona verde e meu capacete para chuveiros, a ajudar minha amada no resgate do meu rebento, pela porta oposta a que tinha entrado! Mas absolutamente apavorado! Menos, porém, que o meu sogro!

Saí procurando, no centro cirúrgico, de porta em porta, e perguntando. Sorte que era antes das 7h da manhã, mas ainda encontrei alguém, com a mesma armadura, que me disse para sair e que não dei muita conversa e continuei procurando, sem mais perguntar. 

Encontrei o velho Altino barrado em uma porta pela pediatra da equipe da Dra. Janete e presenciei, com orgulho, a própria Dra. Janete dizendo com firmeza: - Pode deixar ele entrar! Ele já segurou mais crianças em parto que nunca vais pensar em segurar!

Entrei no vácuo do pediatra! Renovado e confiante! Confiança esta que em poucos segundo terminou quando a prima Lia olhou para mim e disse "cuidado com a bandeja", que era a de bisturis que estava ao meu largo, mesmo tendo a certeza que ela estava longe quando eu passei e que não havia qualquer descuido meu! Óbvio que mesmo assim, colei as nádegas na parede, com a câmera de fotografia até então inútil e esquecida que a Preta também me obrigou a entrar com ela.

Pediram para eu sair na hora da anestesia. Me chamaram quando passou o efeito inicial. Dei um breve cafuné no cabelo da Preta e colei de novo as costas na parede e deixei o Pediatra Altino, fora do serviço, fazer a quádrupla função de pediatra assistente, marido, avô e pai.

Estávamos na cabeça da Camila, quando a pediatra, Dra. Mariana, me olhou esquecido no fim da sala de parto, e me disse quase sussurrando: "venha aqui deste lado", chamando para ir aos pés da Preta.

Parti para o lado oposto, tentando que ninguém notasse a minha presença. E ninguém notou. Quando cheguei do lado da doutora, sempre encostado na parede, ela fez um sinal para a máquina de fotografias e comecei a fotografar freneticamente!

E saíu o moleque! Comprido, magro e lindo, mesmo envolto no sangue e no esbranquiçado da placenta! Não chorou logo, mas chorou depois... Contido... Mas que aplacou a aflição de todos da necessidade de chorar!

Doutora Lia, enquanto a Dra. Janete se preocupava com o fim do parto, levou o Pedro, bíblico, na cabeça da mãe para o primeiro beijo e a Preta, em um misto de alegria e preocupação, olhava e chorava com a criança.

De repente a pediatra Mariana recolhe o rebento e sai com pressa e o Pediatra visitante, Altino, sai correndo atrás! 

Bom, tinham dois, um deles avô e médico parteiro. Fiquei com a minha mulher! Ouvi taxativa uma voz de baixo: - "vai com o meu filho!" Ainda argumentei: - Teu pai está lá e vou ficar com você! Ela diz: - "vai agora ver o Pedro!"

Claro que fui! O Pedro estava ótimo! Tudo procedimento normal! Moleque lindo e saudável! Aliás, nunca vi o meu sogro tão feliz, segurando a criança com aquela máscara cirúrgica mal tirada do rosto e fazendo pose para a máquina fotográfica!

E, como disse no primeiro parágrafo, esta crônica é absolutamente impessoal e somente para o aprendizado dos demais pais de primeira viagem... mas meu filho é a criança mais linda do mundo!

terça-feira, 19 de novembro de 2013

Faroeste Caboclo, O Filme



Digno da música homônima e com roteiro baseado nesta, Faroeste Caboclo me fez sentir um filme brasileiro excelente que há alguns anos não via.

Perto dos filmes cults enfadonhos bem produzidos, mas longe dos besteiróis, muitas vezes sem graça, do novo cinema brasileiro (esse novo é meu, leigo e sem técnica, e muito menos sem querer comparar com o movimento iniciado por Glauber Rocha), o filme passa pela temática da menina da Zona Sul carioca que se apaixona pelo traficante do morro, mas locacionado em Brasília Com uma grande diferença, se baseia na eterna música do Legião Urbana e com um roteiro próprio e original.

Se passa nos anos 80, no fim da ditadura militar não muito aparente, mas presente, em Brasília e Planaltina, com figurino e fotografia ótimos e, principalmente, com trilha sonora do Planalto Central, com pitadas de discoteca, Clash, Billie Idol e Sex Pistols.

Um filme forte, com atuação marcante de Fabrício Boliveira.

A faixa etária é para os maiores de 16 anos, mas aconselho somente para os maiores de 18, acompanhado de uísque.

Da Base.